O risco como novo paradigma estruturante da sociedade globalizada

Danilo Lessa Bernardineli (danilo.bernardineli@usp.br)

No começo do século 21, difunde-se crescentemente a noção de esgotamento dos paradigmas associados a ideía comum da história como sendo uma linearidade do desenvolvimento e da evolução, ambos dos quais são pautados por uma lógica técnico-científica que se apresenta como cada vez mais onipotente perante a natureza como um todo. Este é o modernismo, e o seu desenrolar, ao atingir seus limites e obrigar para uma reflexidade de si próprio, dá luz ao precursor de uma sociedade pós-moderna: aquela no qual a incerteza futura acoplada para com a superação em massa das necessidades básicas acaba por tornar o risco como item central da organização social.

Nesta nova sociedade, nem moderna no sentido tradicional e nem pós-moderna, a divisão deixa de ser entre aqueles que tem ou nao tem - a luta de classes, mas sim o é por meio entre aqueles que estão em condições de alto risco e baixo risco. Não mais a disputa o é pela posse da materialidade, mas sim pelo escapamento do risco percebido. A necessidade é substituida pela ansiedade no que tange a nova motivação de ação coletiva.

Tais afirmativas decorrem dos resultados impostos pela modernidade, com o advento de disrupções rotineiras que apresentam consequências imponderáveis e imprevisíveis sobre o modo de vida bem como a saúde e condição geral das pessoas, assim como a sua abrangência geoespacial. Para essencialmente todas as frutos modernos, não há histórico e nem precedente sobre os efeitos de sua geração, uso e descarte, e nem tradição de como lidar com estes.

Para toda essa incerteza, acoplada da ansiedade, gera-se o risco, um elemento que transcende territórios e classes sociais. A estrutura social passa a se dividir e organizar em torno de consumidores e geradores de risco, o qual é sempre percebido somente parcialmente mediante a posse e/ou fabricação de informação.

Em relação a materialidade, o risco diferencia-se por ser percebido ao invés de se ter posse. Não há uma divisão rígida entre os que tem e não tem, mas sim um espectro entre extremo risco e baixo risco. Adicionalmente, o risco é inclusivo ao invés de excludente: todos estão sujeitos a ele em diferentes graus, mesmo que em classes e territorialidades distintas.

Este último aspecto leva para a relevância do entendimento do risco em uma escala global: a conectividade bem como escala dos efeitos oriundos das tecnológias modernas fazem com que o risco seja globalizado em natureza. Isso é evidente especialmente ao analisar as interações entre as nações ditas como subdesenvolvidas, no qual a necessidade prevalece, e as ditas como desenvolvidas, no qual o risco prevalece. Especificamente, o risco somente é percebido após a superação do modernismo enquanto alicercado na necessidade. Isso faz com que sociedades subdesenvolvidas ignorem o risco dos processos modernizantes, tornando-se geradoras de riscos.

Finalmente, há de se considerar que a conotação do risco pode ser negativa ou positiva a depender da perspectiva de observação e transformação. Em contextos empresariais e disruptivos, a mesma adquire dimensão positiva em diversas instâncias. O mesmo não pode ser dito quando tratativo de contextos tradicionais. A percepção do risco, por sua natureza, tem permeabilidade distinta que pode ser influênciada por diversos fatores, da conectividade e acesso à informação para o contexto economico-social.